quarta-feira, 7 de outubro de 2020

CARLOS E DANIELA

Premissa narrativa:

Carlos e Daniela foram namorados durante quase 5 anos na adolescência, até o dia em que ele subiu em um avião e, sem ao menos avisa-la, se mandou para a Tailândia. Agora, de volta ao Brasil depois de quase duas décadas, ele encontra Daniela, por acaso, comprando peixe em uma banca do Mercado Público. Ela ainda está bonita, mas agora usa uma cadeira de rodas.

    Carlos sonhava todas as noites com Daniela. Por minuto sequer, esqueceu seu amor da adolescência.
    A moça, por sua vez, – que com apenas dezenove anos, tinha perdido dois namorados, o primeiro, morto num acidente de trânsito; e o segundo, Carlos, desaparecido de sua vida – havia superado, obviamente depois de muita terapia e muito tempo para curar suas feridas.
    Carlos finalmente conseguira rever a amada! De volta ao Brasil já há dois meses, encontrou Daniela comprando peixes numa banca do Mercado Público. Seu coração acelerou e suas pernas bambearam, como se não tivesse se preparado para isso. Ele tomou coragem, e chegou perto dela:
    – Olá, Daniela, quanto tempo? – falou com voz trêmula.
    – Olha só, você está vivo! E se lembra de mim! – ela respondeu, com uma ironia provavelmente ensaiada durante quase vinte anos.
    Carlos inventou uma desculpa qualquer, disse que foi para a Tailândia a trabalho e não falou nada para ela para “evitar sofrimento”. Daniela fingiu entender, e acabaram sentando-se numa banca no mesmo local para tomar um café. A moça contou a história de como havia parado numa cadeira de rodas: acidentou-se ao pular de uma cachoeira. Contou também como havia se apaixonado pelo seu médico, casado e tido uma filha com ele. Ao ouvir essa última parte, a expressão de Carlos mudou. Tentou disfarçar, e obteve mais algumas informações sobre a vida de Daniela. Despediram-se combinando um próximo encontro para colocar os assuntos em dia.
    Um mês depois, Daniela já nem lembrava do encontro, e nem que havia combinado outro: “vai ver ele voltou pra Tailândia! Não importa também.”
    Naquela quarta-feira comum, passava o café e preparava-se para trabalhar quando recebeu o telefonema. Seu marido estava morto. Assassinado. Seria um acidente de trânsito forjado, como o primeiro, se Carlos não tivesse vacilado e demorado para sair do local do crime, sendo pego em flagrante dessa vez. Não adiantaria nem fugir do país, estava preso, acabado. Continuava sonhando todas as noites com Daniela.

Vrindecrivo!


(Arte: JÉSSICA BELLOLI - Todos os direitos Reservados)


sexta-feira, 2 de outubro de 2020

TRETA

Vou relembrar aqui uma “treta” em que me envolvi em 2017, após ser desrespeitado, juntamente com os meus colegas, pela organização do Festival “Litoral Canta a Tafona”, de Osório.
           Divirta-se! Vrindecrivo!
        Em 18/9/2017, escrevi: Por respeito à arte sempre. Nossa grande motivação. Sobre o "Litoral Canta a Tafona": nosso cachê foi cortado pela metade, nossa premiação foi cortada completamente, fomos os únicos que não fomos pagos no dia do evento (e ainda estamos esperando). Não fomos filmados. Não tinha nenhum fotógrafo lá. Não houve nenhuma divulgação. O público? Não teria não fossem nossas famílias. Tudo isso pra "economizar", sendo que o Festival abriu um dia inteiro inútil (o sábado), onde não houve classificação nem premiação, só mostrou os músicos de fora (que valem o dobro dos daqui, segundo o regulamento).
         Nossa! Os defensores dos festivais, principalmente os puxa-sacos da administração municipal e da assessora de cultura, vieram para cima de mim. Indiretas, ofensas... Enfim, acabei respondendo, como sempre, com textão. E olha: como eu era ponderado e educado com quem nunca me respeitou! Na época eu tinha medo de me revoltar por achar que fosse “piazisse”, mas hoje, desintoxicado e fora desse mundo podre dos festivais, sei que já pensava o certo.
      Um baterista imbecil falou que eu chorava porque a minha turma e eu éramos das “categorias de base”. Um pianista idiota, reproduziu a fala. Um compositor mau caráter, que já fizera coisas horríveis contra a própria assessora no passado, fez coro aos xingamentos dirigidos a mim. Já passou três anos, e eu permaneço orgulhoso nas categorias de base. Só sairia delas se mamasse nas tetas "da panela" e fizesse mesmices sem nenhuma contribuição artística.
       Segue o texto, carregado de ironia, do mesmo dia do anterior: Ainda sobre a Tafona, para quem não me (nos) conhece: Meu pai desde que chegou em Osório sofre com pessoas que não gostam dele por suas posições críticas e pesadas que sempre buscavam valorizar os músicos. Ele sempre se ferrou pra defender seus alunos e amigos que, sem motivo nenhum, viraram-se contra ele. Sempre vieram aqui e usaram a boca dele pra falar verdades que não tinham coragem para evitar constrangimentos. Mesmo assim, ele continua incansável, batalhando por uma vida cultural decente em Osório, que apesar de um potencial maravilhoso, nunca soube se destacar culturalmente falando. Vocês não fazem a menor ideia do que ele está fazendo nesse momento pela cidade. Todos se beneficiarão!
       Enfim, quando eu falo que o “Litoral Canta a Tafona” nos desvalorizou, é porque nos desvalorizou mesmo. Sim, seria melhor que não houvesse, se fosse para ser como foi. A diferença é que eu falo para as pessoas certas, e se não há solução, falo publicamente mesmo, buscando única e exclusivamente a correção desses problemas para as próximas edições. Respeito todo mundo, e não acho que vão haver retaliações para com o meu trabalho pois todo mundo é profissional, e acima de tudo todo mundo é amigo, ou deveria ser.
     Eu prefiro ser autêntico e buscar o respeito do que, por exemplo, ficar indignado e soltar um palavrão quando “perco” um festival para um conterrâneo. Eu prefiro ser autêntico do que ficar falando mal da organização nos próprios bastidores e depois rasgar elogios no Facebook. Eu prefiro ser autêntico do que renegar e tirar do meu currículo um grupo do qual participei e ajudou a me alavancar para o sucesso. Enfim, eu prefiro ser autêntico, respeitando as diferenças, e buscando REPEITO para com o meu trabalho. Se eu sou desrespeitado como fui na semana passada, vou lutar. Esse é o meu recado.
    Meu pai foi um dos pioneiros desse movimento, ele musicalizou uma região (palavras de uma professora minha da UFRGS), lutou e continua lutando pela arte e pelo sucesso dos seus “guris” e “gurias”. É muito ruim vê-lo triste e indignado, sentindo-se traído e renegado por quem ele sempre amou e, principalmente, ajudou a crescer, elevando os tantos talentos que existem na região.
     Minha crítica NUNCA foi à assessora de Cultura Adriana Sperandir, que aproveito aqui para também parabenizar, pois com certeza, sem ela e seu esforço, a Tafona teria morrido. Minha crítica é e continua sendo para os próprios músicos que se desvalorizam, e para um regulamento que desqualifica o trabalho da região e dos artistas iniciantes.
       Enfim, eu sou um dos maiores entusiastas da união dos artistas e a arte pela arte! Eu acredito que a UNIÃO seja o princípio básico para todos nós. E isso eu aprendi com o meu pai! Durmo muito tranquilo sabendo que é verdade, pois ensino isso e consigo passar para os meus alunos, o que me dá muito orgulho! Vamos nos unir de verdade, pessoal! Criticar sem perder amizades! Debater sem brigar! Não há nada melhor do que isso!

(IMAGEM: Minha última participação em festival, em 2017, que gerou toda essa treta. - FOTO: Arquivo Pessoal)

terça-feira, 29 de setembro de 2020

JUSTIFICATIVAS (E + PROMESSAS)

Então, pessoal, eu não sumi de propósito, pelo contrário: tenho muita coisa pra contar aqui. Acontece que a tal disciplina “escrita criativa” não me forçou a escrever um textinho por semana, como eu falei que forçaria, e eu já havia me programado para isso. Resumindo: o blog seria atualizado de acordo com o andamento dela, e tudo desandou por causa disso. Peço desculpas por não ter aparecido aqui por um mês e dez dias, mas pra quem estava acostumado a desaparecer por mais de um ano, é um progresso, não acham?

Vamos por partes, vou enumerar aqui os textos que publicarei em seguida, para compensar esse atraso. Primeiro, vou relembrar uma “treta” que acabei me envolvendo no ano de 2017, por conta de um festival, na época em que eu me metia com essas drogas. Depois, vou colocar um textinho da “escrita criativa”, criado após tema designado. Mais tarde, uma reflexão sobre como a cidade de Osório destrói deliberadamente o seu patrimônio histórico e cultural e por último, um detalhamento sobre como foram as minhas semanas do último dia oito até dia vinte (acho que vai render mais de uma postagem).

Ah! Outra novidade: pretendo atualizar o meu clássico “Artemizade”, pois agora, mais velho e experiente (haha!), com uma percepção atualizada de quem são meus amigos e o que os torna especiais, acho que posso fazer uma boa reflexão. Além disso, com os finalmentes da graduação, vou fazer alguns trabalhos interessantes sobre História, e se for do interesse, posso publicar. O certo é que todos que forem de História pública eu vou colocar aqui, pois estamos precisando de divulgação científica nos dias atuais.

É isso. Caso alguém me leia, agradeço pela paciência de fazer isso, e principalmente por ter esperado nesse breve hiato. Aguarde minhas palavras!

Vrindecrivo!

(Imagem: minha visão no momento. Eu gosto desse tipo de coisa, mesmo não tendo sentido nenhum. FOTO - ARQUIVO PESSOAL)

quarta-feira, 19 de agosto de 2020

NUNCA MAIS RECLAMO!

Eu estava cansada de andar pelo reino entregando alaúdes da oficina do meu pai, um dos maiores artesãos da cidade. São instrumentos de boa qualidade e nós ganhamos um bom dinheiro, portanto, ele poderia pagar algum outro empregado para fazer as entregas. Qual foi minha surpresa quando vi que a última entrega seria para um velho amigo, que conhecia desde criança? Estava exausta, e contei a ele sobre meu dia e minhas indignações. Ele, compadecido, me serviu uma taça de vinho, que tomei com muita vontade! Que aroma maravilhoso! Depois ele tocou algumas músicas no seu alaúde novo, que eu acabara de entregar. No fim, valeu a pena a minha tarefa, o final do dia foi perfeito.

Imagem inspiradora: A taça de vinho, de Johannes Vermeer.
Vrindecrivo!

( Acesso em: https://blog.famigliavalduga.com.br/quadros-famosos-com-vinhos-representados-em-sua-composicao/ )

terça-feira, 11 de agosto de 2020

BOAS NOVAS!


Tenho uma boa notícia para quem me acompanha por aqui (se é que tem alguém que faça isso): a partir de amanhã, faço novamente a disciplina eletiva Escrita Criativa, como complemento da minha graduação em história. O que isso significa? Que terei muitas histórias novas e diferentes, a partir das mais diversas propostas para publicar aqui! Tenho saudades de criar personagens e situações, e da outra vez que fiz a disciplina, ninguém leu nada que escrevi (vergonha, talvez). Mas agora eu prometo compartilhar com vocês tudo o que escrever, e também as observações do professor e as mudanças que porventura venha a fazer nos textos. Enfim: uma nova fonte incrível de conteúdo para o MusiLiteratura surgiu!
Vrindecrivo!
(IMAGEM: Eu, neste momento, dando a notícia pra vocês! Arquivo Pessoal)

domingo, 9 de agosto de 2020

REFLEXÃO CLICHÊ


Não vou fazer uma reflexão sobre como a arte nos salva e que sem ela toda essa situação que estamos vivendo em 2020 seria impossível de ser superada, pois já faço o papel de advogado da arte há muito tempo e não é a isso que me proponho agora.
Participei agora a noite de um sarau cultural virtual. Foi muito legal, como quase todo e qualquer sarau, porém o que eu percebi e que achei muito interessante foi o ineditismo de ter tanta gente de lugares tão distantes, que dificilmente se reuniriam um dia na vida para tocar músicas e recitar poesias. Proponho que essa prática adotada por conta da pandemia se estenda para sempre, pois, precisamos tirar de tudo isso coisas positivas.
Quando pudermos nos reencontrar, que voltemos aos saraus, aos shows, aos teatros, galerias e exposições; mas que mantenhamos o costume de reunirmos virtualmente para conhecer a arte de pessoas que não estão próximas de nós fisicamente.
O Projeto Dandô já vem há muitos anos fazendo essa ponte entre músicos de todas as partes do mundo, mas nós, infelizmente, precisamos ficar impedidos de sair de casa para passarmos a utilizar a internet como ferramenta principal dessa interação!
Nunca substituiremos os encontros presenciais, o calor do momento, a interpretação corporal, mas se tem uma coisa que a internet nos dá e com muita qualidade (e precisamos de 30 anos pra entender) é a possibilidade de termos arte e conexões pessoais no conforto da nossa casa.
Vrindecrivo! (Este foi o texto mais clichê que eu já escrevi na vida)

(IMAGEM - Encontro virtual que participei agora há pouco. Print: Arquivo Pessoal)

quarta-feira, 29 de julho de 2020

OS VILÕES DO PASSADO


Publico aqui um trecho de uma tirinha de 2010, um dos primeiros trabalhos do Felipy, quando ele estava começando a desenhar e criar quadrinhos, com dez anos de idade. A meu pedido, ele criou a “Turma da Galera da Rima”, e sobre isso eu tenho muito (“romance, ou não?”) a falar ainda. Estou fazendo um resgate histórico das carreiras dos meus pais e minha, com ênfase na trajetória da Rima.
A história da Galera da Rima é muito rica e merece ser contada. Vai chegar o momento! O caso é que neste trecho da tirinha (abaixo) em específico, a cantora da Galera da Rima conversa com o vilão da turminha. Em baixo, o nosso recado de que “semelhanças com personagens e fatos era mera coincidência”. Balela! O vilão era inspirado numa criança real, que fazia mal às outras seja com palavras ou até ações. Aliás, esse menino continua vilão até hoje, dez anos depois. Bolsominion, claro, e com comportamentos nocivos em seus ciclos sociais. É triste! Muitos professores tentaram ajudar enquanto era tempo, mas nada deu certo. Fica de lição para pais e responsáveis: atentem ao comportamento de crianças, não relativizem maldades. Às vezes pode não ser coisa da idade.
Voltarei com outras histórias da Galera em breve. Vrindecrivo!

IMAGEM: ARQUIVO PESSOAL (CATTULO DE CAMARGO E CAMPOS)
DESENHOS DE FELIPY CAMARGO (com 10 anos de idade)
RIMA EDIÇÕES LÍTERO-MUSICAIS - TODOS OS DIREITOS RESERVADOS

domingo, 26 de julho de 2020

BOA VIAGEM, CHARLIE BROWN

Ontem, mexendo no "Prime Video", descobri uma animação que eu não via há muitos e muitos anos: Boa viagem, Charlie Brown é um filme roteirizado, obviamente, pelo genial Charles M. Schulz, que estreou nos cinemas em 30 de maio de 1980.
Por ser uma obra que já tinha onze anos quando eu nasci, talvez não tenha marcado a minha geração da mesma maneira que marcou a anterior, mas a mim, despertava uma magia que eu não sei até hoje explicar, mas vou tentar.
Quem me ler agora poderá achar loucura, pois com certeza eu não vou conseguir colocar em palavras somente nesse texto o sentimento que eu tinha (quando criança) e tive (ontem).
Eu não me lembrava de várias passagens do filme. O início por exemplo, de como a turma conseguiu suas passagens para a França, ou então que apareciam alguns adultos na animação (raridades na obra de Schulz). Mas uma coisa eu lembrei, da metade pro final: o sentimento que a noite francesa me causa(va).
É incrível! A trama era para ser "sombria" para as crianças, pois, uma garota misteriosa convida Charlie Brown e Linus van Pelt para passarem sua estadia francesa no "Chatô do mal-vizinho". Paty Pimentinha e Marcie ficam na casa de Pierre, um garoto que logo conta que indo ao Chatô, os meninos correrão grande perigo, pois ninguém pode se aproximar de lá, principalmente estrangeiros.
Cenas escuras e chuvosas dão a dimensão do que Linus e Charlie Brown passariam, pois ao chegar no Chatô, não encontram ninguém e nem conseguem entrar, tendo que ir dormir num curral que fica ao lado. Eles acampam e designam Snoopy e seu fiel companheiro Woodstock para que fiquem de guarda durante a noite enquanto eles dormem. Aí a magia acontece(ia) pra mim!
Snoopy e seu amarelado companheiro saem caminhando da propriedade, que se mostra cada vez mais sombria. Andam muito durante a noite no vilarejo francês. Chegam num "pub", um bar da noite que funcionava na cidadezinha. Snoopy coloca músicas na "jukebox", vai até uma mesa e começa a beber várias e várias cervejas (cabe aqui ressaltar que o cachorro faz o papel de "adulto" que acompanha as crianças na viagem, pois é ele, por exemplo, quem dirige o carro alugado por eles na Europa). São cenas rápidas, que mostram ele bebendo, rindo, chorando, dançando e aproveitando a noite francesa. É nesse mesmo "pub" que o Barão (o antagonista da trama) vai durante a noite deixando sua sobrinha  (aquela garota misteriosa) livre para interagir com os meninos.
Quando o dia amanhece, Snoopy e Woodstock voltam para o Chatô, embriagados, deixando claro que passaram a madrugada inteira no bar, e se deitam para dormir. Na noite seguinte, partem novamente para a diversão notívaga. Eu não sei que idade eu tinha: cinco, seis anos, talvez? Só sei que ficava simplesmente encantado com aquele mundo, e com a sensação que aquilo me causava. Lembro de assistir várias vezes o filme quando criança.
Anos mais tarde (muitos), eu encontrei na internet um "gif" que representava um "pub" europeu, com imagens sombrias, um saxofonista e um pianista no palco, uma mulher escorada num balcão fumando um cigarro e algumas pessoas em mesas e assistindo os músicos. O texto que acompanhava era algo como "imagine-se neste local, uma chuva torrencial lá fora, é madrugada". E isso também mexeu comigo! Me deixava encantado e, apesar de adulto, sonhando com aquela vida e querendo estar lá. Até hoje eu nunca tinha feito a ligação da sensação que eu tive ao ver esse "gif" com a sensação de criança vendo o Snoopy no "pub" francês. É indescritivelmente a mesma! É loucura? Parece que descobri um objetivo de vida: passar uma madrugada num local desses. Mas tem que ser necessariamente na Europa. Pergunto de novo: eu estou ficando louco?
É uma nostalgia misturada com uma grandessíssima ansiedade! Voltarei a abordar este assunto, provavelmente, creio que só o encerrarei quando finalmente realizar esse sonho.
Vrindecrivo! Na Europa, por favor!
Gente, olhem essa cena! Eu quero! (não me julguem)
Acesso em: https://filmow.com/boa-viagem-charlie-brown-t8459/

O GIF que citei no texto. Infelizmente não poderei dar o crédito e nem citar a fonte, pois eu salvei ele no meu computador há muitos anos e não anotei nada disso. Se alguém souber, por favor, me avise!

domingo, 19 de julho de 2020

PRIMEIROS RELATOS DO RIO GRANDE DO SUL

Há uma obra do historiador brasileiro Guilhermino César (1908 – 1993) chamada “Primeiros Cronistas e Viajantes (1605 – 1801): estudo das fontes primárias da história riograndense acompanhados de vários textos”. Vivian Ignes Albertoni, na sua tese de doutorado, explica a importância desse trabalho para entendermos a formação do Rio Grande do Sul:
"Trata-se de textos fundamentais para compreensão da formação do povo gaúcho, escritos por viajantes, jesuítas e desbravadores de todo o tipo que pelo Rio Grande passaram (políticos, guerreiros, intelectuais), Cada um merece uma pequena apresentação do próprio Guilhermino César, seguida pela íntegra dos textos, o que faz dessa publicação uma das iniciativas mais importantes dentro do campo da pesquisa histórica gaúcha, de que se tem notícia até hoje." (2006 p.26)
São escritos fantásticos! Vale muito a pena ler e aprender um pouco sobre o que pensavam diferentes personagens que compuseram a nossa história.
O relato que apresento hoje pra vocês, um entre tantos, foi escrito por André Ribeiro Coutinho, que tinha o posto de Mestre-de-Campos, e foi o segundo governador da Capitania de Rio Grande de São Pedro de dezembro de 1737 a dezembro de 1740. Guilhermino César contextualiza esse texto dizendo que até a década de 1730 o Rio Grande era como uma “terra de ninguém”, sem uma cultura que vicejasse em torno das outras às quais os viajantes, indígenas ou expedicionários traziam. O relato de André Ribeiro Coutinho inaugura uma espécie de encantamento pela terra e preconiza (ou profetiza) o quão maravilhosa a “unidade” será através do século XVIII. É uma carta datada de setembro de 1737 para um amigo seu.
O relato tende a responder a pergunta “do que é esta terra”, e André Ribeiro Coutinho a trata como “terra de muitos” porque tem abundância de tudo. Cita animais, matérias primas, inconvenientes, até condições climáticas (provavelmente surpreso pelas estações do ano bem definidas), frutas e outras plantações, também condições otimistas como “muita esperança”.
Diz que há falta de muito, também, e que por isso a terra deve ser explorada e tratada como uma nova unidade. São raízes de um pensamento que pode ser considerado útil para a colônia e forte para a criação do que hoje conhecemos como Rio Grande do Sul.
Vrindecrivo!
(IMAGEM: Leitura recomendada, trecho do livro“Primeiros Cronistas e Viajantes (1605 – 1801): estudo das fontes primárias da história riograndense acompanhados de vários textos”., do historiador brasileiro Guilhermino César (1908 – 1993) )

sábado, 11 de julho de 2020

A FIGURA DO GAÚCHO


A distinção Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade concedida pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura é muito importante, e até os dias atuais o Brasil tem cinco dos seus bens culturais imateriais (dentre todos os registrados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) reconhecidos como tal: a Roda de Capoeira, o Frevo, o Samba de Roda do Recôncavo Baiano, a Celebração Religiosa Círio de Nazaré e a pintura corporal dos povos indígenas Wajãpi, a Arte Kusiwa.
Argentina e Uruguai, por sua vez, obtiveram sucesso juntos, em 2009, quando apresentaram o projeto e tiveram aprovado a incorporação do Tango na lista da UNESCO. Para isso, tiveram de se comprometer com uma série de exigências e adequações, entre elas o de fomentar o gênero musical como “da região do Prata”, e não “nacional” de um lado ou de outro. Creio que podemos traçar um paralelo entre essa situação e a da típica figura do gaúcho. Talvez pela experiência prévia que Argentina e Uruguai tiveram juntos, há a esperança de apresentar um projeto interessante juntamente com o Brasil para a incorporação da figura do gaúcho na distinção.
O gaúcho vem de antes das fronteiras, e é um homem da região que compreende os três países, por isso faz sentido ser um projeto coletivo. O criador de gado que exerce suas atividades em cima de um cavalo e toma mate foi, com o passar do tempo, tipificado. Se tomarmos por exemplo a literatura, o gaúcho foi sendo construído como um personagem, do "tradicional" ao contemporâneo. Recomendo esse texto sobre o assunto.
Na cultura, principalmente nas atividades artísticas, ainda há muita resistência sobre a figura do gaúcho. A invenção da indumentária, por exemplo, por Paixão Cortes, é tomada como tradicional, e muitas pessoas acham que os gaúchos dos séculos XVIII e XIX realmente usavam chapéu de aba, camisa social e bombachas largas, ou que as mulheres usavam pesados vestidos rendados e coloridos. Nico Fagundes falava sobre isso (nos bastidores), que nem ele, nem o próprio Paixão imaginavam que “inventariam” uma tradição. Hoje em dia, os CTGs têm vários traços preconceituosos em seus estatutos, que não condizem com a sociedade contemporânea, prezando esse tradicionalismo exacerbado.
Creio que a figura do homem e mulher gaúchos deve se modernizar, não desprezando o passado aguerrido que constitui o imaginário da população, mas, assim como na literatura, aceitar as novidades. Uma mulher com cabelo curto pode carregar a força e o orgulho de Anita Garibaldi. Um homem tatuado ou homossexual pode dançar danças típicas e ter orgulho do seu estado. Aí a figura do gaúcho, tão tipificada, passaria a ser só um símbolo, e não uma regra de comportamento.
Vrindecrivo!
(Imagem: o estereótipo da figura do gaúcho que tento desmistificar no texto de hoje. Foto: Olhares do Brasil/Duda Pinto / Divulgação | Acesso em https://p2.trrsf.com/image/fget/cf/940/0/images.terra.com/2015/07/19/gaucho2.jpg)

sábado, 4 de julho de 2020

JUSTIÇA E ARTE

Não tenho condições, exatamente, de discorrer sobre justiça de maneira apropriada. Obviamente, não sou jurista, advogado ou qualquer outra coisa relacionada à direito, mas também, não é desse tipo de justiça que pretendo falar, e sim daquela que profissionalmente, ambiciono (ou ambicionava).
Eu tenho vivido na minha carreira diversas situações que me colocam a pensar se verdadeiramente vale a pena fazer arte nesse país e ou nesse momento. Recentemente o Banco do Estado do Rio Grande do Sul, a maior estatal financeira dessas bandas, publicou um edital para promover lives artísticas como uma espécie de auxílio para uma das classes que mais ficou desamparada por conta da pandemia. Pois vocês sabem qual era o critério para seleção? Número de seguidores nas redes sociais (Instagram, Facebook e YouTube). Claramente, os beneficiados com o cachê dessa promoção seriam aqueles que não precisam, ou como costumamos chamar internamente, os “de sempre”. Felizmente, choveram críticas ao edital e ao próprio banco, que resolveu cancelá-lo. Se teremos uma nova proposta com critérios mais justos, ainda é um mistério.
Outro ponto que me chama muita atenção é a vida dos festivais de música. Se outrora já foram o maior fomentador de novos talentos, revelando artistas maravilhosos da história do Rio Grande do Sul, ultimamente se transformaram em negócios para poucos músicos que vivem do dinheiro que eles pagam, e são figuras carimbadas em todas as edições de todos os eventos que ainda restam. Claro que não estou tirando o mérito artístico de nenhum deles, mas é muita inocência presumir que não existem outros músicos tão bons quanto eles, ou até melhores, que simplesmente não se encaixam na dita “panela festivaleira” instaurada há algum tempo. Eu já fui um entusiasta da Moenda, da Tafona ou da Califórnia, nas duas primeiras já toquei, mas, já tem três anos que me afastei totalmente desse meio, desgostoso e triste com o que sempre presenciava.
Mais um exemplo que posso lembrar é o das premiações e grandes distinções de arte fornecidas pelos trabalhos publicados no ano corrente (literatura, teatro, música, entre outros). Para usar mais uma vez da minha experiência, em 2014 o arranjador do meu primeiro CD foi indicado e premiado pelo seu trabalho numa premiação muito importante aqui do estado, na categoria arranjo. Pois bem, fiquei muito feliz, apesar de que na cerimônia, foram citados outros dois trabalhos dele realizados no mesmo ano. O nosso? Nem menção. Até aí tudo bem, talvez o Cordas&Rimas não tivesse realmente qualidade suficiente para ser mencionado, e eu jamais me incomodaria com isso. O que aconteceu depois é que foi o problema: um dos jurados do tão aclamado prêmio deu sua justificativa para o meu CD não ter participado e nem sequer ter sido mencionado em nada. Aceitei tudo, naturalmente. Meses depois li um artigo dessa mesma pessoa, elogiando um outro trabalho, e enaltecendo qualidades em coisas que eram exatamente as mesmas que tinha criticado no meu.
E a hipocrisia, então? Essa é a que mais dói quando lembro o quão ingrata pode ser a vida artística. A união entre artistas é utópica, infelizmente. É assim em todas as áreas: um quer que o outro se ferre. Já vi um músico exclamando “puta que pariu!” ao “perder” uma premiação para um amigo. Sim, para um amigo e conterrâneo! Já vi outro músico enviando um e-mail anônimo para um festival de outro estado, com justificativas ridículas pedindo a desclassificação de um também amigo e conterrâneo. No teatro? Já vi dono de companhia superfaturando valor de equipamentos como justificativa de não partição de premiação entre os atores. Já vi grupos grandes suprimindo e ameaçando menores. Já vi pessoas usando titulações como se fossem garantia de caráter (isso no teatro e recentemente, também na literatura). Já vi muito! Muito a ponto de querer desistir.
O que é a arte se não um espelho da vida? Basta entrar em qualquer rede social para ver o que o ser humano se tornou, e como isso está em todos os âmbitos, todas as áreas, todas as carreiras. Aí, percebo que a culpa não é da arte, e me volto a ela, cabisbaixo, pedindo desculpas. Ela ainda é o que me resta de esperança em dias melhores. O ponto de querer desistir acima mencionado se termina, e a vontade de fazer algo de verdade, com essência, volta. Eu sou um ciclo, e acredito que serei para sempre.
Vrindecrivo!
(IMAGEM: Voltando às origens, a minha visão ao escrever este indignado texto. Arquivo Pessoal)

UM CONCEITO DE CLASSICISMO

Percebi que pela primeira semana eu acabei não colocando nada aqui no dia "combinado". Até tinha textos prontos, como o que vai seguir essa introdução, mas não tive tempo, realmente de vir aqui fazer a postagem. Estou na última semana de um dos últimos semestres da faculdade, então vocês podem imaginar que as coisas andam um pouco corridas. Enfim, para não deixar a semana em branco, vou publicar um dos trabalhos que fiz para a disciplina de História da Arte, onde analiso o capítulo Um Conceito de Classicismo, de Anatol Rosenfeld e J. Guinsburg, fazendo uma síntese da ideia dos autores sobre as principais características que definem a arte. Lembrando que não temos aqui uma definição de Classicismo, e sim a exemplificação de suas características principais. Espero que estejam todos bem, e Vrindecrivo!

O classicismo é definido pelos autores de diversas maneiras, e no capítulo temos a apresentação de diferentes características e singularidades. Primeiro, temos uma visão geral e um aspecto histórico da definição da própria palavra “classe”, depois um passeio pelas características e uma breve explicação de cada uma delas.
Inicialmente, a arte clássica pode ser identificada como a que segue “preceitos modelares”, baseados de uma fase da arte grega, resgatando as ideias e os padrões. Essa fase aconteceu principalmente no Renascimento.
Outra característica apresentada é a de que o classicismo é o domínio do diurno, ou seja, busca uma clareza e uma racionalidade. “[...] elementos como o equilíbrio, a ordem, a harmonia, a objetividade, a ponderação, a proporção, a serenidade, a disciplina, o desenho sapiente, o caráter apolíneo, secular, lúcido e luminoso.” (pg.374). Diz que numa obra de arte clássica, o que há é a “[...] imitação da natureza e, imitando-a, imita seu concerto harmônico, sua racionalidade profunda, as leis do univeso.” (pg.374). Podemos dizer de uma “busca pela perfeição”.
Também há um dos aspectos que mais chama atenção: a impessoalidade transmitida na obra. O valor da obra é o que ela transmite por si só, não o que ela diz do seu autor, portanto ele foge das subjetividades e de quaisquer manifestações, e, segundo os autores, “desaparece por trás da obra”.
Há também a rígida separação das artes, elas não se confundem, cada uma obedecendo às suas próprias regras e moldes pré-estabelecidos. Os autores ainda apontam que as obras poderiam perder o valor que poderiam alcançar, caso confundam essas artes, não seguindo as regras específicas de cada uma.
A próxima característica apontada é a “lei da tipificação” que diz que a arte clássica não individualiza, não se caracteriza por diferenciações, e o objetivo é sempre a chegada ao geral ou típico.
Além da separação das artes anteriormente citada, há também a separação dos estilos. Buscando clareza e regularidade, cada estilo deve seguir padrões próprios para se autoafirmar e se caracterizar como o mesmo.
Por fim, os autores apontam que “[...] o valor estético reside na obra, e somente nela.” (pg.375). Uma obra deve falar por si e fazer valer-se esteticamente, além de ser bonita, ter uma natureza didática. Quanto mais uma obra colaborar para o conhecimento e aperfeiçoamento do gênero humano, mais ela será bem realizada.
São essas as principais características do classicismo apontadas por Anatol Rosenfeld e J. Guinsburg no capítulo “um conceito de classicismo”.
(IMAGEM: O Nascimento de Vênus (1484-1486), de Sandro Botticelli - Acesso em https://static.todamateria.com.br/upload/ve/nu/venusclassicismo.jpg)

quarta-feira, 24 de junho de 2020

ESCRAVIDÃO NO RIO GRANDE DO SUL

É de praxe lermos por aí (até de alguns historiadores) que a escravidão no Rio Grande do Sul foi mais amena. Ledo engano! Por aqui houve muita crueldade, muitas práticas tristes, muito horror e tudo o mais, tanto quanto no resto do país. Para explicar um pouco disso, deixo com vocês uma síntese que fiz sobre o texto “A Produção Charqueadora e Mão de Obra Servil”, do historiador Jorge Euzébio Assumpção; e do curta-metragem “O Continente de São Pedro”, nos seus episódios 7 e 8, exibidos pela RBSTV em 2002. Quem tiver interesse em adquirir esse material pode entrar em contato comigo por e-mail, pois ele é difícil de ser encontrado na internet (e isso deve ter um motivo, por isso também não vou disponibilizar). Enfim, bons estudos e Vrindecrivo!

Situação dos trabalhadores nas charqueadas
Por conta da distância e das estradas com inúmeros obstáculos e dificuldades de travessias, o território do atual Rio Grande do Sul não tinha o mesmo fluxo que o Nordeste ou a capital da colônia. Por isso, os contatos comerciais e de desembarque de novos moradores eram mais desenvolvidos nas regiões litorâneas, principalmente perto do porto de Rio Grande.
As atividades comerciais então na região de Pelotas começaram a se desenvolver e os principais estabelecimentos charqueadores foram instalados por ali. As exportações da Capitania de São Pedro não se limitavam ao território da colônia, e iam também para vários outros lugares no mundo que mantinham esse contato comercial.
Pelotas era a cidade mais importante da região no século XIX, e, segundo o documentário “Continente de São Pedro”, muitos perguntavam por qual motivo ela não era a capital (que já estava em Porto Alegre). Tanto no documentário quando no texto de Jorge Eusébio Assumpção, há um tempo dedicado para mostrar a formação da cidade de Pelotas, com sua alta cultura e crescimento exacerbado para a época e diferente de todo o resto da capitania e província (pois ocorreu do final do século XVIII até meados do século XIX). Mas, o mais importante para se analisar é que por trás de todo esse crescimento e dessa pompa europeia, estavam muitos e muitos trabalhadores escravizados.
Consta que no ano de 1822 Pelotas tinha cerca de 22 estabelecimentos de charque, e cada um deles tinha cerca de oitenta trabalhadores escravizados, alguns chegando a mais que o dobro disso. O status dos donos desses estabelecimentos era notório, e muitos deles contribuíam inclusive financeiramente com o Estado, para a execução de obras públicas e benfeitorias para a própria cidade (como a Santa Casa, por exemplo). Eles também enfrentavam problemas como a concorrência da região do Prata e as tributações que precisavam enfrentar, o que seria futuramente uma das causas da Revolução Farroupilha. Logo, a economia gaúcha era muito influenciada por essas produções, dependendo então exageradamente da mão-de-obra escrava para manter-se e prosperar.
Sobre a minimização que alguns autores fazem sobre a utilização de mão-de-obra escrava no atual Rio Grande do Sul, tanto o texto quanto o documentário provam que é uma mentira e até uma injustiça com os descendentes desses. Nos estabelecimentos charqueadores, a escravidão marcou presença forte, indiscutivelmente, e a situação dos escravizados é análoga às daqueles que trabalhavam nas plantações de cana e café no restante do país, dos quais mais ouvimos falar. Jorge Euzébio Assumpção diz que a tese da pouca participação do negro na formação do Rio Grande do Sul não se sustenta, e apresenta dados que comprovam a afirmação.
A mão-de-obra escrava era utilizada nas charqueadas principalmente porque não havia trabalhadores livres que queriam sujeitar-se aos serviços pesados que o ofício exigia. Apesar disso, consta que nelas havia um pequeno número de trabalhadores assalariados, em outras funções (cerca de dez, frente aos oitenta escravizados já citados).
As famílias escravizadas também não eram incentivadas, pois os senhores preferiam trabalhadores homens e sem vínculos nas charqueadas. As mulheres escravizadas faziam outros serviços na própria charqueada ou então nas casas das famílias que eram donas delas. O documentário mostra que existem ainda hoje ruínas dessas casas, quase sempre palacetes. As senzalas ficavam geralmente nos porões, e forneciam o que os negros poderiam chamar de “descanso” após longas rotinas de trabalhos.
Por fim, Jorge Euzébio de Assumpção aborda as fugas e as preocupações com elas. A maior era que os escravos “fujões” acabassem apoiando as colônias espanholas na fronteira, ajudando nas lutas com a portuguesa. Outra era com a formação dos quilombos, que também foi uma prática daqui. Vemos que os escravizados que fugiam e eram capturados acabavam marcados com ferro em brasa, com a letra F. O mais importante dos quilombos era o de Manoel Padeiro, que pela organização, causava pânico nas cidades, pois temiam uma revolução vinda de lá.
A conclusão, tanto de Jorge Euzébio de Assumpção, quanto do documentário da RBSTV, é de que o processo charqueador foi a mais importante atividade econômica da região, e que foi totalmente construída em cima do sangue e do trabalho forçado de milhares de negros escravizados. A escravidão na região do atual Rio Grande do Sul existiu, não exatamente acabou antes, e foi tão cruel quanto no resto do Brasil, e não tem motivo para ser “amenizada”. Reconhecer isto é um passo importante na luta atual contra o racismo e ajuda a combater a visão errônea de que os europeus aqui trataram os africanos de forma diferente.


(IMAGEM: Seres humanos escravizados trabalhando na produção de charque. Representação da realidade da formação do atual Rio Grande do Sul. Acesso em: https://www.geledes.org.br/wp-content/uploads/2015/04/charque-gaucho.jpg )

quarta-feira, 17 de junho de 2020

(IN)DIRETA

Da série inDIRETA para neofascista: Quero que saiba que a minha profissão é inatingível. Não tem quebra de empresa, não tem crise global, não tem nenhuma situação que me deixaria a ver navios. Oscilações acontecem como em qualquer outra, mas o que eu faço aqui eu faço no Uruguai, em Portugal, nos EUA, em Cuba ou na Venezuela. Nunca comi um pão que não viesse da música em toda a minha vida, além disso construí com meus pais um patrimônio que me orgulha muito. Logo, você, empresário genérico ou empregadinho em grande empresa, parente bolsonarista que me ameaça: "um dia tu pode precisar de mim", pense que a recíproca é verdadeira.
Vrindecrivo!
(IMAGEM: Acesso em https://pbs.twimg.com/media/Dqi2HSBWsAAGps-?format=jpg&name=medium)

terça-feira, 9 de junho de 2020

BOSSA LEE

Comecei agora a noite (aproveitando a quarentena) a gravar alguns vídeos, e criei um canal no YouTube "solo", ou seja, separado dos canais da escola ou das bandas. O primeiro vídeo é uma das minhas composições com a Maria Ottilia. A letra aborda o "ser" e o "viver", mas gosto particularmente de como ela, em conjunto com a melodia, evidencia nossas mais profundas influências.
Vrindecrivo!



BOSSA LEE
Cattulo de Campos e Maria Ottilia Rodrigues.

Cansei de tocar "bossinha" assim
Sou rock gaudério de festival
Mentira foi sempre o meu aval
Prelúdio moderno, vida carnal
Ânsia de compor histórias repletas
De visão dos extraterrestres
Cegos que enxergam ao som da luz
Maldita cigana que me conduz
Jorge Ben Jor, Os Mutantes
Contradições Contrastantes
Ritmo perverso que não existe
Palavras aguçadas, não me irritem!
Mas quando eu toco, eu sou pura bossa-nova
Quando eu for vó eu vou ver 'A praça é nossa'
Mas quando eu canto eu sou rock'n'roll
“Pra” mim ainda falta muito feijão com arroz
Mas quando eu falo, eu sou muito "bossinha"
Ai, tão menininha, já “tô” bem crescidinha.

quarta-feira, 3 de junho de 2020

ÉRAMOS FELIZES E SABÍAMOS

Junho de 2014. Sete horas da manhã. Acordo, tomo banho, um café preto com uma torrada e desço do nono andar em direção à bela Rua da Praia. Como Porto Alegre está segura! Desde que a Copa do Mundo começou, há dois brigadianos por esquina. Ontem, por exemplo, conseguimos voltar a pé da Cidade Baixa até o centro, às duas da manhã.
Encontro o Celso na padaria, ele tomou seu café por lá. O cumprimento entusiasmado: hoje vai ser demais, Celsinho! Partimos para o Largo Glênio Peres, em frente ao Mercado Público, pois lá está acontecendo a Orange Fest, um dos eventos mais esperados por nós desde que confirmado um jogo da seleção holandesa em Porto Alegre.
No caminho, discutimos sobre o valor do dólar, pois logo ele vai fazer o seu mestrado nos Estados Unidos: dois reais e vinte e cinco centavos. Passamos por uma propaganda de posto de gasolina: dois reais e oitenta centavos o litro. Triste, tem gente colocando adesivos eróticos da Presidenta na boca dos tanques dos veículos: “não dá para acreditar que existe gente ruim assim, né, Celso? Deve ser um ou dois tucanos que estão em campanha duvidosa para daqui quatro meses. Aliás, será que escolheram certo? O Aécio não me cheira muito bem, não.”
Ah! Sim, a Presidenta Dilma. Não acho o seu governo perfeito, longe disso, mas sei que uma mulher que viveu o horror da ditadura na pele estar na presidência é uma prova concreta e irrefutável de que a democracia venceu.
Chegamos no Mercado Público! Tem muita gente, quem será que é holandês de verdade? Sim, aquele cara vestido de leão completamente embriagado com certeza é. As duas meninas que vimos ontem na CB, será que elas vêm? E o jogo hoje? Goleada na Austrália ou vai ser pegado?
Tenho trabalhos para entregar da faculdade. O primeiro semestre pode ser difícil, também. Vou voltar a dar aulas no interior a partir de agosto? Ainda não sei. Não vou pensar nisso agora. A vida aqui é legal. Esse momento é legal.
Vrindecrivo!
(FOTO: Holandeses tomando conta de Porto Alegre. Nós estávamos lá com eles! Acesso em http://globoesporte.globo.com/platb/files/1249/2014/06/holandeses1.jpg)

quarta-feira, 27 de maio de 2020

TRISTEZA

Acho que eu já escrevi sobre estar triste em algum momento, realmente não lembro. Eu não estou me sentindo bem e já tem um tempo, e sei que é perfeitamente normal por conta da quarentena.
Nós artistas tendemos a sofrer mais. Há estudos sobre isso mas eu realmente não quero pesquisar agora. Não costumo digitar no celular, nunca. É estranho porque conheço pessoas que já escreveram livros nesse aparelho.
Enfim, eu só estou aqui por obrigação (como se tivesse muitos leitores). Já estou deitado, com frio e triste, abandonado. Eu sei que tenho amigos que posso contar a qualquer momento, e não entendo porque mesmo assim me sinto tão sozinho.
Queria sentir a felicidade de outrora, porém minha mente sabe exatamente que isso é normal, que é só química no meu cérebro limitado me fazendo mal nesse período conturbado.
Não me faço de vítima, sei de todos os meus privilégios e não consigo deixar de ser solidário, de pensar no bem do próximo e do mundo. Consigo disfarçar muito bem e jamais faria mal a mim mesmo nem às pessoas próximas de mim.
É difícil estar nesse país nesse momento. É difícil estar sozinho nesse momento. É difícil se sentir inútil e incapaz nesse momento.
No lugar de escrever esse texto, procurei nas notas do meu celular algo que pudesse colocar aqui, e foi a pior burrada que fiz: eu compunha muito, vivia muito, fazia muito, e parei com isso. Chorei. Chorei de novo. Pela primeira vez na vida faço um desabafo desse tipo publicamente, porém sei que vai chegar em uma, duas pessoas no máximo, logo, não acho que não deva fazer. Obrigado por se preocuparem comigo, sei que vai passar.
Vrindecrivo!
Acesso em https://disney.fandom.com/pt-br/wiki/Tristeza
(IMAGEM: Tristeza do filme Divertidamente, uma das maiores obras cinematográficas contemporâneas. Acesso em https://disney.fandom.com/pt-br/wiki/Tristeza)

quarta-feira, 20 de maio de 2020

CORDAS E RIMAS

Ah! A música! Tão bela, tão completa e maravilhosa. Ela que trouxe a gente até aqui, juntamente com sua melhor companheira: a amizade! A Rima é música, a música é a Rima. O Cordas&Rimas é música e é amizade. É assim desde a década de 1970, quando o meu pai, Paulo de Campos, juntamente com seus amigos Rui Morselli, Zé Caradípia e Zê Azemar colocaram esse nome e essa marca na vida dos gaúchos. O Cordas&Rimas é renovação: sempre foi! O Cordas&Rimas é Lucas Braun, Diego Sá, Gian Correa... É Guilherme Castro, Brenda Netto, Yasmim Frurek, Yuri Correa, Patrik Almeida e tantos outros. É hoje, mais do que nunca, um local onde amigos se encontram. Cordas&Rimas é hoje minha irmã Ivana Munari. Cordas&Rimas sou eu, Cattulo de Campos. Cordas&Rimas é o meu irmão Patrik Hertzog. Cordas&Rimas é amizade. Ponto.
E o que é amizade? É valorizar o que foi feito! Amizade é olhar para o futuro sem esquecer do passado. Amizade é estarmos juntos, unidos pela música como sempre. Amizade é ter essas três pessoas unidas pela arte, e tanta gente assistindo pelo amor! Não sei se é amigona ou amiguinha, se corre ou engatinha, se é verdade ou mentirinha. A amizade pode ser um caminhão ou uma lambretinha... A amizade é Cordas e Rimas! E o nosso público pode ter certeza, que faremos hoje e sempre canções para serem mais dele do que nossas!
Vrindecrivo!
(Foto: NÓS! <3 - ARQUIVO PESSOAL)

terça-feira, 12 de maio de 2020

BRASIL DE PELOTAS

Eu era criança e comecei a me interessar por futebol. Às vezes eu visitava e passava uns tempos em Pelotas. Sempre que eu conversava sobre esporte com determinadas pessoas de lá, e principalmente do esporte local, eu ouvia frases de desprezo ao time vermelho e preto. Na minha cabeça, era normal, assim como Grêmio e Inter, nós azuis queremos sempre o pior (em campo) para os vermelhos.
Fui percebendo, no entanto, que aquele discurso sempre vinha com estereótipos: torcida bandida, favelada. Pobre, violenta etc. Minha cabeça infantil assimilava essa fala, e, provavelmente a repetia. O Pelotas, grande Lobão, é o time de gente decente; O Brasil é o time dos bandidos.
Saio do interior rapidinho para traçar um paralelo com os times da capital: não é exatamente a mesma coisa? Esse discurso excludente e preconceituoso não aparece até hoje na boca de alguns gremistas? Eu já fui torcedor de estádio, e pior, já frequentei a Geral do Grêmio nos tempos de Olímpico. Nunca falei, mas cantei macaco nas músicas que continham essa palavra. A justificativa que me convencia? É só uma música. É estádio, vale tudo. Não é racismo, é porque macaco imita. Enfim, morro de vergonha desses dias, mas tenho a consciência tranquila de que eu não entendia o que estava acontecendo e muito menos tinha noção de que estava fomentando (e sendo cúmplice de) um crime.
Voltando para Pelotas, lembro de quando pesquisei pela primeira vez sobre o Brasil e sua história. Depois daquele acidente horrível com o ônibus da delegação em 2009, eu descobri que o primeiro campeão gaúcho tinha a maior torcida do interior. Uma torcida trabalhadora e fanática, que era capaz de fazer maravilhas pelo amor ao seu time. Entendi que o preconceito que eu escutava era porque a sede do clube era num bairro periférico, que atraia as massas e a população mais empobrecida, diferentemente do clube do Centro. Passei a desconstruir a visão negativa e transformá-la em uma simpatia.
Essa divisão social em clubes de futebol não existe. Uma vez meu primo, na maior inocência, perguntou para o meu pai: “tio, por que tu é gremista se tu sempre foi pobre?”. Ora, essa pergunta veio na cabeça dele pela desinformação passada pela irmã, de que o Inter era time do povo, dos pobres, e o Grêmio o time da elite, dos ricos. A generalização tem uma lógica espacial no seu começo, por conta do passado sombrio (terrível início do século XX), mas depois se perdeu. Porém, ela é usada até hoje (por gremistas e colorados) da pior forma possível: afirmar uma tradição preconceituosa. Desculpem voltar a falar dos clubes da capital, é porque estou mais familiarizado com eles, mas creio que seja a mesma coisa em Pelotas.
Toda essa reflexão me veio porque me dei por conta, hoje, muitos anos depois, que aquelas determinadas pessoas que tentaram me ensinar esse preconceito estereotipado em relação ao Brasil de Pelotas, são hoje bolsonaristas convictas. Faz todo o sentido do mundo, não? Elas já davam mostras de que lado estariam numa instauração de regime fascista, excludente e preconceituoso. Os tempos de hoje são difíceis, sombrios, mas pelo menos ainda podemos falar sobre eles. O que está acontecendo no país é o advento de uma minoria (cerca de 30%), porém perigosa massa,  que crê e segue cegamente um homem, sua família criminosa e seu sistema que já vem matando muitas pessoas, usando a arma da desinformação e das notícias falsas.
Quando comecei a estudar o fascismo (ou os fascismos), há alguns anos na faculdade, confesso que fui inocente o suficiente para acreditar que a sociedade iria aprender com aqueles erros. Voltando mais ainda no tempo, quando o saudoso Professor Cleto, da Rural, mostrou para a minha turma a primeira versão do filme A Onda, eu não fui capaz de assimilar que aquilo poderia tornar-se realidade. E tornou-se, não numa experiência de escola, mas numa experiência de país, de novo.
“Ah! Alarmista, você! Comparando o bolsonarismo com regimes autoritários.” – Será que estamos tão distantes mesmo? Há inúmeras mostras do quão periclitante a situação está. Não sei das capacidades cognitivas do presidente, mas sei o que o aparato por trás dele pode fazer com as pessoas. Foi muito fácil pegar essas pessoas que eu citei no início da minha exposição, que já tinham o ódio e o preconceito dentro de si, e transformá-las em verdadeiros propagadores de mentiras, dispostos a vender sua dignidade e o pingo de caráter que resta dentro delas para um projeto, repito, fascista.
Cabe a nós, incrivelmente em meio a uma pandemia, lutarmos nessa guerra. Viva a cultura! Viva a informação! Viva o amor por todos e de todos! Viva a educação! Viva o Mengo, o Coringão, o Inter e o Brasil! E viva a democracia! Lutaremos por ela enquanto a temos, pois será muito mais difícil se deixarmos que a tomem de nós.
Vrindecrivo!
Torcida do Corinthians lutando por democracia, impedindo manifestações fascistas em São Paulo. “Ué! Corinthians? O texto não é sobre o Brasil de Pelotas?” – Leia tudo, por favor!
(FOTO: REPRODUÇÃO/FACEBOOK - ACESSO EM https://www.correio24horas.com.br/noticia/nid/torcedores-do-corinthians-impedem-manifestacao-de-bolsonaristas-em-sao-paulo/)

AUTOCRÍTICA

Eu não faço ideia se procede, mas na manhã deste quente sábado litorâneo, acordei por acaso, tendo que ligar o celular às pressas (sim, durm...