sábado, 11 de julho de 2020

A FIGURA DO GAÚCHO


A distinção Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade concedida pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura é muito importante, e até os dias atuais o Brasil tem cinco dos seus bens culturais imateriais (dentre todos os registrados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) reconhecidos como tal: a Roda de Capoeira, o Frevo, o Samba de Roda do Recôncavo Baiano, a Celebração Religiosa Círio de Nazaré e a pintura corporal dos povos indígenas Wajãpi, a Arte Kusiwa.
Argentina e Uruguai, por sua vez, obtiveram sucesso juntos, em 2009, quando apresentaram o projeto e tiveram aprovado a incorporação do Tango na lista da UNESCO. Para isso, tiveram de se comprometer com uma série de exigências e adequações, entre elas o de fomentar o gênero musical como “da região do Prata”, e não “nacional” de um lado ou de outro. Creio que podemos traçar um paralelo entre essa situação e a da típica figura do gaúcho. Talvez pela experiência prévia que Argentina e Uruguai tiveram juntos, há a esperança de apresentar um projeto interessante juntamente com o Brasil para a incorporação da figura do gaúcho na distinção.
O gaúcho vem de antes das fronteiras, e é um homem da região que compreende os três países, por isso faz sentido ser um projeto coletivo. O criador de gado que exerce suas atividades em cima de um cavalo e toma mate foi, com o passar do tempo, tipificado. Se tomarmos por exemplo a literatura, o gaúcho foi sendo construído como um personagem, do "tradicional" ao contemporâneo. Recomendo esse texto sobre o assunto.
Na cultura, principalmente nas atividades artísticas, ainda há muita resistência sobre a figura do gaúcho. A invenção da indumentária, por exemplo, por Paixão Cortes, é tomada como tradicional, e muitas pessoas acham que os gaúchos dos séculos XVIII e XIX realmente usavam chapéu de aba, camisa social e bombachas largas, ou que as mulheres usavam pesados vestidos rendados e coloridos. Nico Fagundes falava sobre isso (nos bastidores), que nem ele, nem o próprio Paixão imaginavam que “inventariam” uma tradição. Hoje em dia, os CTGs têm vários traços preconceituosos em seus estatutos, que não condizem com a sociedade contemporânea, prezando esse tradicionalismo exacerbado.
Creio que a figura do homem e mulher gaúchos deve se modernizar, não desprezando o passado aguerrido que constitui o imaginário da população, mas, assim como na literatura, aceitar as novidades. Uma mulher com cabelo curto pode carregar a força e o orgulho de Anita Garibaldi. Um homem tatuado ou homossexual pode dançar danças típicas e ter orgulho do seu estado. Aí a figura do gaúcho, tão tipificada, passaria a ser só um símbolo, e não uma regra de comportamento.
Vrindecrivo!
(Imagem: o estereótipo da figura do gaúcho que tento desmistificar no texto de hoje. Foto: Olhares do Brasil/Duda Pinto / Divulgação | Acesso em https://p2.trrsf.com/image/fget/cf/940/0/images.terra.com/2015/07/19/gaucho2.jpg)

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